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Revista Exame

Melhor profissão do ano nos EUA deve explodir no Brasil

Atualizado: 23 de out. de 2019


Coletar, organizar e interpretar dados para sustentar a tomada de decisão em instituições públicas ou privadas. Esse é o resumo da profissão do estatístico, apontada como a melhor de 2017 nos Estados Unidos por um recente estudo do site CareerCast.

Segundo o levantamento, a ocupação registra altos níveis de satisfação em quesitos como renda, estresse, ambiente de trabalho e perspectivas de ascensão.

As habilidades do estatístico ajudam a produzir sentido e orientar estratégias em um mundo cada vez mais abarrotado de números e dados. Instituições de todos os tipos, portes e setores precisam desse apoio na era do big data.

Não à toa, o cientista de dados — outra possível ocupação para quem se forma em estatística — ficou em 5º lugar no ranking do CareerCast.

No mercado de trabalho norte-americano, a perspectiva é que a empregabilidade dos estatísticos salte nada menos do que 34% nos próximos 7 anos.

Mas, se essa é a realidade da profissão nos Estados Unidos, o que dizer do Brasil?

Na visão de Magda Carvalho Pires, professora e coordenadora do curso de estatística da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), a profissão também está entre as mais satisfatórias do momento no país e as oportunidades devem continuar se multiplicando nos próximos anos.

“Aqui o cenário não é diferente dos Estados Unidos: há muita busca por profissionais da área, e o número anual de graduados é pequeno frente a essa demanda”, explica ela. Como há muitas vagas e poucos candidatos, os salários estão crescendo.

Nem sempre foi assim. “Ser reconhecido pelo mercado como um profissional com potencial estratégico para a organização foi um desafio para o estatístico, pois ele era visto como um mero ‘fazedor de contas’ ou alguém que só trabalharia no censo do IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] e nas pesquisas de intenção de voto em época de eleições”, explica Pires.

Com o tempo, empresas e órgãos públicos foram percebendo que, num mercado cada vez mais competitivo, as decisões para redução de custos e para a melhoria na eficiência não poderiam ser tomadas com base em “achismo” ou em fatos isolados: era preciso contratar profissionais capazes de fazer uma leitura analítica dos dados.

Hoje, diz a professora da UFMG, há uma enorme oferta de oportunidades no setor financeiro, telecomunicações, indústrias, marketing e o próprio governo, por meio de concursos públicos em suas agências como Anatel, Aneel e Anvisa, além de ministérios.

A profissão é regulamentada desde 1968 e hoje conta com o Conselho Federal de Estatística (CONFE), além de 7 conselhos regionais (CONRE).

A profissão mais “sexy” da década

Para Júlio Trecenti, vice-presidente do CONRE-3 (Conselho Regional de Estatística da 3ª região – SP, PR, MT, MS), a carreira tem aplicações em qualquer setor. “Mais recentemente, temos visto um crescimento na demanda por estatísticos em setores como direito e saúde, que não costumavam contratar esse tipo de profissional no passado”, explica.

Afinal, números e dados estão em absolutamente tudo — e sua análise pode ser tão útil quanto surpreendente.

O blog da empresa “Curso-R”, criado por Trecenti e outros ex-alunos do IME-USP (Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo) mostra alguns exemplos interessantes desse fato. Há ilustrações bem-humoradas de como a estatística ajuda a entender o uso das cores nos filmes de super-herói, a popularidade do canal “Porta dos Fundos” e até as expressões faciais de Aécio Neves, por exemplo.

Essa divulgação do lado divertido da estatística tem ajudado a quebrar o estereótipo de que essa é uma profissão árida ou desinteressante.“Com o aumento do interesse pela política, por exemplo, surgiu a Operação Serenata de Amor, que analisa dados de contas públicas, descobre fraudes e contribui para o combate à corrupção no Brasil, e gerou um grande buzz na sociedade”, diz Trecenti. “É uma prova de que as pessoas enxergam cada vez mais a importância desse campo do conhecimento para as suas vidas”.

Ainda assim, a quantidade de jovens interessados no curso de estatística ainda é relativamente pequena no Brasil.

Segundo Denise Silva, pesquisadora e coordenadora da ENCE (Escola Nacional de Ciências Estatísticas), vinculada ao IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), muitos vestibulandos com aptidão para ciências exatas ainda preferem prestar engenharia.

“A carreira não tem tanto status no Brasil, porque nossa cultura ainda privilegia carreiras mais tradicionais”, explica ela. “Apesar de não ter salários iguais aos da engenharia, sempre sugiro aos jovens com gosto pela área quantitativa para experimentarem a estatística”.

A pesquisadora da ENCE lembra a previsão de Hal Varian, economista-chefe do Google que disse em 2009 que estatística seria profissão mais “sexy” da década, e acrescenta que “o céu é o limite” para as perspectivas de crescimento desse mercado no Brasil.

Mesmo com a crise? Para Silva, o mau momento da economia também atinge os estatísticos, mas em menor grau do que outros profissionais. “Nossos alunos não estão preocupados”, diz ela. “Especialmente em São Paulo, nos bancos e indústrias, a empregabilidade da área continua boa”.

Na opinião de Trecenti, o estatístico não viu a crise acontecer. Na verdade, diz ele, o mercado “explodiu” no Brasil nos últimos anos — até graças à recessão econômica. As adversidades fizeram as empresas buscarem aumento de eficiência e corte de custos, missão para a qual o estatístico é uma figura valiosa.

Salário pode chegar a R$ 30 mil

Um estudo do Ipea (Instituto de Pesquisas Avançadas) apontou que o estatístico tinha em 2013 a segunda melhor remuneração do país: uma média mensal de 5.416 reais, atrás apenas dos médicos, que ganhavam em média 6.940 reais por mês.

Pires diz que, embora não haja uma pesquisa oficial que indique o salário médio no Brasil para a profissão, a análise das vagas de emprego abertas nos últimos anos indica que a remuneração inicial está entre 2,5 e 4 mil reais. Já a contrapartida financeira para cargos de gerência ou diretoria pode alcançar até 30 mil reais.

Segundo o CONRE-3, consultores chegam a cobrar 400 reais por hora e os estagiários podem receber bolsa de até 2.500 reais.

Veja abaixo os salários em regime de contrato CLT (40 horas semanais) sugeridos pelo CONFE (Conselho Federal de Estatística) em 2017, de acordo com o grau de qualificação do profissional:

Qualificação Salário médio sugerido (R$)

Bacharel 3.528,73

Especialista 4.538,74

Mestre 5.994,10

Doutor 7.104,12

O perfil de quem se dá bem

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De acordo com Pires, é obrigatório que o estatístico tenha aptidão para matemática e apetite por exatas de forma geral, já que lidará sempre com números. Também deve ter fortes habilidades computacionais, uma vez que seu trabalho se baseará fortemente em softwares e bancos de dados.

“Além disso, deve ter boa capacidade de interagir com equipes multidisciplinares e ser criativo para transmitir eficientemente a informação

gerada pelos números”, explica a professora da UFMG.

A comunicação, aliás, é uma das habilidades mais valorizadas em um estatístico pelo mercado. De acordo com Trecenti, o perfil de quem tem sucesso nessa carreira passa longe dos estereótipos: definitivamente não se trata da pessoa que fica “quietinha” num canto do escritório fazendo contas.

Muito pelo contrário. O estatístico precisa saber se expressar muito bem, para que os resultados das suas análises sejam compreensíveis por pessoas de outros departamentos, leigas no assunto. Isso inclui comunicação oral e escrita.

Curiosidade, atenção para detalhes, raciocínio analítico, foco em resolução de problemas e interesse pela metodologia científica completam o rol de competências que caracterizam os melhores profissionais desse mercado.

A capacidade de adaptação também ajuda. Afinal, diz Silva, o estatístico sempre precisará aprender um pouco sobre o negócio em que atua. Se trabalha para uma indústria de refrigerantes, por exemplo, precisa entender sobre o mercado da bebida; se está empregado em um banco, deverá desvendar o universo financeiro; e assim por diante.

Essa flexibilidade significa estar disposto a trabalhar com pessoas de outras áreas e até de outras nacionalidades. Isso porque muitos estatísticos acabam construindo carreiras internacionais.

“Podemos trabalhar em qualquer lugar do mundo, na China, no Cazaquistão, no Brasil, tanto faz”, diz a coordenadora da ENCE. “Não precisamos de revalidação do diploma e a atividade é a mesma em qualquer lugar”. Para o estatístico, o mundo das possibilidades — numéricas ou não — tende ao infinito.

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