2020 não poderia ter sido mais desafiador para os profissionais de RH. Não houve empresa que saiu incólume da realidade imposta pela pandemia do novo coronavírus. O setor precisou correr contra o tempo para renovar seus cuidados com a saúde – mental e física – dos colaboradores, promover a transição do trabalho presencial para o quase obrigatório modelo remoto e, claro, se atualizar com todas as novas medidas provisórias e ações governamentais para estancar a crise que a transmissão do vírus impôs a negócios de todos os portes.
Por mais que o termo “pós-pandemia” tenha ganhado força em listas de tendências e em debates sobre estratégia e cultura organizacional, 2021 não começa diferente do que foi o ano passado. Embora as organizações já estejam mais adaptadas às restrições impostas pela Covid-19 e aos cuidados necessários com a equipe de trabalho, a pandemia ainda apresenta números altos de casos e óbitos, o que justifica que o alerta siga mantido. Por conta disso, o planejamento de ações do RH para este ano não pode ignorar o atual cenário.
Confira, então, alguns pontos que o RH deve se atentar desde já para 2021, o ano que não vai “começar depois do Carnaval”:
Recrutamento online
Em meio às discussões sobre como tornar o processo de recrutamento & seleção mais rápido e, consequentemente, mais estratégico, softwares que apoiam o RH na ação estão cada vez mais inovadores. Com o uso de inteligência artificial, as ferramentas otimizam o tempo dedicado às contratações, filtrando perfis e apresentando aos recrutadores os candidatos mais aptos à vaga estabelecida. E se a tecnologia para R&S já ganhava força e importância, com a pandemia isso se potencializou, uma vez que a necessidade alavancou os processos seletivos virtuais.
“Com publicações em grupos, de forma gratuita, ou anúncios direcionados para o público que se quer atingir, as postagens aparecem em tempo real, o que ajuda a diminuir esforços para atrair mais interessados e filtrar as candidaturas recebidas. Aí está a facilidade. Depois de selecionados aqueles profissionais que tenham o perfil que a empresa busca, fazer as entrevistas utilizando ferramentas de videochamada permite conhecer o candidato sem que ele precise se deslocar até a empresa, gerando economia, já que a única necessidade para que a entrevista seja feita é que os participantes estejam conectados à Internet e acessem um link para entrar na reunião”, pontua George Paiva, diretor de RH da Orange Business Services na América Latina.
Home office e hibridismo
O home office se tornou uma das práticas mais consolidadas do período pandêmico. Enquanto algumas empresas precisaram de uma profunda adaptação ao trabalho a distância, outras “sofreram menos” por já terem a adesão do trabalho remoto uma ou mais vezes por semana – ou até mesmo integralmente.
De acordo com a ‘Pesquisa Gestão de Pessoas na Crise Covid-19’, realizada pela Fundação Instituto de Administração (FIA), 46% das empresas respondentes incorporaram o home office a sua rotina, porém 67% delas relataram dificuldades no início do processo. Ainda assim, a experiência conta com índices positivos. Segundo o levantamento ‘Os erros e acertos do home office durante a pandemia’, feito pelo RH Pra Você em parceria com a SocialBase, 65,6% do público composto por gestores e colaboradores avaliam o trabalho remoto como bom ou ótimo.
Entretanto, por mais que um modelo híbrido – presencial e remoto – comece a ser pensado e planejado por algumas organizações, seu sucesso depende de questionamentos importantes, tais como:
· O quanto o trabalho remoto impactou a produtividade dos colaboradores?
· Os funcionários estão felizes trabalhando a distância? Quais dificuldades a nova rotina apresenta a eles e como elas podem ser superadas?
· Há estrutura para que os empregadores desempenhem bem as suas funções trabalhando em ambiente fora do escritório?
· Como está a gestão das lideranças e do RH referente aos colaboradores a distância?
Além disso, é fundamental se atentar à legislação do trabalho remoto. Para o advogado Marcus Vinicios de Carvalho Ribeiro, do escritório Flávio Pinheiro Neto Advogados, a evolução dessa modalidade de trabalho não exige apenas adequação das empresas, mas também respaldo jurídico.
“Atualmente, não há uma previsão legal para essa mudança brusca que está ocorrendo. Muito se falava em tendências do mercado corporativo, incluindo a atuação remota, mas a pandemia acelerou estes processos de maneira inimaginável. Agora, empresas, profissionais e especialistas precisarão trabalhar para garantir segurança jurídica ao adotarem processos híbridos de atuação”, diz.
Outra questão que tem se destacado entre empresas que adotam este modelo é o fato de a gestão passar por grandes mudanças. “O empreendedor e seus líderes acabam tendo que mudar a própria cultura da empresa em alguns pontos. Afinal, até que ponto o gestor pode ir em relação à cobrança de resultados? Qual a melhor forma de alinhar as demandas e garantir que não haja interpretação errada de feedbacks e processos de trabalho? Estes fatores precisam ser bem desenhados neste novo formato”, comenta o jurista.
Segurança de pessoas e de dados
Segurança é uma das principais palavras-chave de 2021 para o RH. E em todos os sentidos.
No aspecto pessoal, o employee experience passará muito pelos cuidados que as empresas terão com a saúde de seu time. Segundo pesquisas, o cenário pandêmico só fez crescer casos de ansiedade, tristeza, estresse e depressão. E os transtornos não se limitam a quem precisa sair de casa para trabalhar. Mesmo os colaboradores em home office estão com a saúde mental atingida pelo panorama atual. Portanto, do mesmo modo que os cuidados com a saúde física devem continuar (fornecimento de máscaras, recipientes de álcool em gel, medição de temperatura das pessoas e do ambiente, etc.), estratégias para cuidar do emocional devem ser desenvolvidas ou fortalecidas.
“A má gestão dos riscos psicossociais prejudica tanto os trabalhadores quanto a empresa. Isso impacta em custos mais altos em termos de saúde e segurança dos trabalhadores, para a empresa e para a sociedade em geral. Os custos relativos aos riscos psicossociais para as organizações podem ser muitos e variados e surgem direta ou indiretamente como: maior absenteísmo e rotatividade; custos com substituição de pessoal, acidentes de trabalho e doenças ocupacionais; queda da produtividade (falta de motivação entre funcionários, conflitos, etc.); má qualidade de produtos ou serviços; prejuízo à imagem da empresa; maior risco de passivo trabalhista”, esclarece a Dra. Ana Carolina Peuker, CEO e fundadora da Bee Touch, que acrescenta:
“Já as consequências dos riscos psicossociais para o trabalhador podem repercutir em sintomas emocionais, comportamentais e/ou físicos, como estresse, distúrbios do sono, abuso de álcool e outras drogas, dor nas costas, enxaqueca, depressão, conflitos, Burnout, assédio, suicídio, entre outros.”
O outro aspecto de segurança que as empresas precisam estar alinhadas é a cibernética. Em vigor desde o ano passado, a Lei Geral de Proteção de Dados tem regras claras sobre o tratamento de dados pessoais realizados pelas organizações. Seja online ou offline. E a partir de 2021, as empresas que não estiverem adequadas às suas exigências poderão sofrer multas e outras sanções legais.
Além disso, com as organizações aderindo a recursos cada vez mais digitais, a atenção em relação a fraudes, armazenamentos de informações, deve ser redobrada. É recomendável, inclusive, orientar os colaboradores sobre potenciais ações que podem pôr em xeque sua segurança digital pessoal e a do negócio. Segundo dados de uma recente pesquisa da Check Point® Software Technologies Ltd. (NASDAQ: CHKP), três em cada quatro especialistas temem, por exemplo, que modalidades de trabalho a distância aumentem a ameaça de golpes virtuais.
“As fronteiras entre vida pessoal e profissional foram rompidas à medida que o trabalho está sendo realizando em casa via internet fornecida por Provedores de Serviço de Internet (ISPs), com roteadores e máquinas possivelmente sem patch de proteção, além de outros dispositivos conectados na mesma rede e membros da família compartilhando computadores enquanto trabalham para diferentes organizações. Enquanto Redes Privadas Virtuais (VPNs) podem proteger conexões com locais de trabalho, os usuários domésticos terão que estar cautelosos das vulnerabilidades das VPNs que podem levar a ataques remotos”, ressalta o estudo ‘Turning the Tide: Security Predictions for 2021’, elaborado pela Trend Micro.
Hora de repensar os benefícios
Falar de benefícios é delicado. Embora considerável parte das empresas siga a linha “tradicional” do mercado, como o oferecimento de vales refeição e alimentação, é necessário pensar fora da caixa para seguir competitivo no mercado, uma vez que as exigências dos colaboradores (especialmente das novas gerações) são crescentes – e não, não estamos falando de autorizar o uso de bermuda às sextas-feiras.
Embora os benefícios padrão ainda cumpram o seu papel, é fundamental que as empresas sejam criativas para se adaptar às mais diversas situações. Por exemplo: um cartão de vale-refeição é atrativo durante uma pandemia em que as pessoas estão trabalhando de casa e deixando de ir a restaurantes?
Outro ponto a ser refletido é: o mesmo benefício para todos os colaboradores funciona? Por que não substituir o gympass de um funcionário que, por conta própria, já frequenta uma academia, pelo pagamento de um curso que ele deseja fazer ou que vai ajudá-lo a se desenvolver dentro do negócio? A flexibilização de benefícios é uma tendência em alta.
“Oferecer novos formatos traz uma grande satisfação para os colaboradores e ajuda o RH a reter talentos. A empresa que adota esse modelo ganha um grande diferencial, se tornando mais competitiva, além de motivar o seu colaborador”, comenta a especialista em desenvolvimento de negócios e benefícios corporativos da Galcorr, Leili Kelly Lira”.
People Analytics
Já que falamos em dados, não há como não falar em People Analytics. Uma das principais tendências do chamado “RH moderno”, o PA é também um de seus maiores desafios.
Antes de tudo, o People Analytics é, em termos simples, uma metodologia de coleta de dados – via Big Data – que ajuda na condução da tomada de decisões no processo de gestão de pessoas nas empresas. Não somente coletar por coletar dados, mas saber quais são os mais importantes no negócio e como, por meio deles, alinhar pessoas ao propósito da empresa, aumentar a produtividade e potencializar o engajamento, justificam a importância das organizações buscarem o uso do PA.
Segundo um levantamento feito pela Deloitte em 2018, 84% dos respondentes consideram o PA como um recurso de extrema importância para o desenvolvimento do negócio. A adesão do People Analytics ainda não caminha a passos largos no que diz respeito a um grau total de maturidade da ferramenta por parte dos negócios, mas se movimenta em uma curva de evolução.
André Franco, CEO do Dialog.ci, supperap de comunicação interna e RH para empresas que funciona como um hub para o colaborador, salienta as métricas se tornaram fundamentais e são uma estratégia para as necessidades do futuro. “Por meio delas é possível detectar e analisar mudanças e tendências internas e externas. Além disso, possibilitam que os líderes e gestores tenham perspectivas e planejamento para anteciparem e enfrentarem os desafios do ambiente corporativo que estão em constante transformação”.
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